Os momentos mais curiosos de todas as noites eleitorais são os discursos dos líderes partidários. Aconteça o que acontecer, em 90% dos casos o líder partidário vai cantar vitória, mesmo que tenha perdido votos e deputados e tenha sido ultrapassado por outros partidos. Há (quase) sempre um ângulo pelo qual é possível ver a vitória do seu partido. Ontem, só mesmo Manuela Ferreira Leite não teve o descaramento de o fazer (e muito mau seria se ela o fizesse...). Na minha opinião, olhando friamente para os resultados de ontem, só um partido pode, legitimamente, cantar vitória: o PP. Mas a mim, neste momento, interessa-me analisar outro dado, pertinente dadas as muitas análises feitas nas últimas semanas às possíveis coligações pós-eleitorais que o PS teria de fazer: a Esquerda perdeu.
Agora vocês dizem: mas ó André, estás bem? O PS ganhou, a Esquerda é maioritária no Parlamento, BE e CDU cresceram em deputados... Pois, tudo isso é uma verdade, mas os 7 deputados que a Esquerda perdeu para a Direita são suficientes para impedir um coligação bi-partidária à Esquerda. Para uma governação em maioria, o PS tem de se colar à Direita. Para uma governação em minoria, o PS terá de, pontualmente, negociar à Direita. Esta é a maior derrota que a Esquerda poderia ter tido. Uma coligação tri-partidária é impensável e só pontualmente poderemos ver os 3 partidos juntos no Parlamento. Acredito que será mais fácil para Sócrates fazer acordos pontuais com o PSD ou mesmo com o PP e deixar os acordos com a Esquerda radical para as questões fracturantes. Sejam quais forem as opções de futuro de Sócrates e colegas governativos, a verdade é que este governo, sem uma coligação que lhe garanta maioria parlamentar, ficará fragilizado e refém da Oposição, que terá, por seu lado de ser mais responsável do que tem sido. Têm agora a possibilidade de fazer cair o Governo a qualquer altura com uma moção de censura, mas terão também de saber gerir esse poder que lhes caiu nas mãos e evitar usá-lo para benefícios partidários. Sócrates terá de aprender a ouvir os outros partidos, o que não é necessariamente mau (bem pelo contrário), mas viverá na corda bamba. A vitória de ontem poderá transformar-se numa derrota dentro de um ou dois anos se não souber gerir e negociar convenientemente. E, se isso acontecer, quem perderá, acima de todos, será o país.
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