15 fevereiro 2010

Um ataque de histeria colectiva


Devo dizer que começa a preocupar-me seriamente o estado de histeria colectiva em que uma boa parte do país se encontra mergulhado, por causa da censura e falta de liberdade de opinião de que sofremos. Acho incrível a leveza com que se usa o termo censura num país que muito sofreu com a censura a doer, em que pessoas eram presas, torturadas e mesmo assassinadas por causa do que diziam. É absurdo e ofensivo para aqueles que com ela sofreram e é, acima de tudo, um insulto à memória e ao legado do 25 de Abril. Fazia bem a estas pessoas pararem um pouco para pensar no que a palavra realmente significa.

Acredito que a distância que me separa geograficamente de Portugal permite-me ter um olhar mais distanciado e poder ver com maior clareza a big picture, algo que se torna difícil quando estamos no meio do turbilhão e somos todos os dias metralhados por notícias e opiniões de um só sentido. E aqui, do outro lado da Europa, fico com a clara sensação de estarmos perante um ataque orquestrado com um único propósito: derrubar José Sócrates. O primeiro-ministro (pelo qual, já o disse e repito, não tenho particular admiração) tem sido alvo de repetidos ataques (até, imagine-se, da Presidência) que visam desgastar a sua imagem perante a opinião pública. Curiosamente, isso não o impediu de ser re-eleito e de continuar a subir nas sondagens pós-eleitorais. No entanto, a subida de tom destes ataques dos paladinos da justiça (não se esqueçam que o ponta-de-lança desta equipa é a sempre confiável Manuela Moura Guedes) tem surtido os seus efeitos e mesmo na cúpula do PS começa a falar-se, aqui e ali, na possível substituição de Sócrates.

Se isto de facto acontecer, será um enorme passo atrás na democracia portuguesa. Será a subversão do sistema, será o derrotar de um governo democraticamente eleito às mãos de um grupo de pessoas sedentas de poder e capazes de tudo para o alcançar. Estes movimentos de justiceirismo e de julgamentos na praça pública e nas capas dos jornais estão a assassinar a democracia portuguesa e o local onde a liberdade de expressão mais fielmente se apresenta: as urnas. Quando o resultado de eleições democráticas é posto em causa por notícias não legitimadas, pelo diz-que-disse, por rumores e especulações, então estamos a recuar no tempo e a entregar a política a um mundo sujo de intriga e interesseirismo, a um mundo de vale-tudo com fins pouco claros onde o resultado final será tudo menos uma democracia.

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