Estar longe de casa dá-nos a possibilidade de olharmos para o nosso ambiente natal de uma forma diferente, e leva-nos a apreciar coisas que antes nos passavam despercebidas. Estando longe de Portugal, aprendi a apreciar pequenos pormenores, deliciosos, que antes, por serem rotina, me passavam ao lado. Aprende-se a apreciar de forma diferente coisas grandes e pequenas; a distância torna-nos eternos enamorados daquilo que não podemos ter. Dito por outras palavras: a distância enamorou-me de Portugal.
Infelizmente todos os amores têm momentos de dúvida e angústia, e este não é excepção. O último par de semanas trouxe ao de cima algumas das coisas de que menos gosto no nosso país, aquilo a que chamo Portugal dos pequenitos, um país mesquinho, sombrio, da crítica (ou pior, do insulto) fácil, que ainda não saiu das grutas onde Viriato refugiava o seu povo dos invasores Romanos. É o país onde uma pessoa não pode ter uma opinião contrária, onde o debate se faz com paredes, onde somos ostracizados por pensar de forma diferente. É um país preso à mentalidade que o reinou durante séculos, fosse nos tempos das monarquias absolutistas ou das ditaduras fascistas.
Vem isto a propósito, está o leitor a adivinhar, da polémica em volta das declarações de Saramago sobre a Bíblia. Não escrevo isto por achar que ele está coberto de razão (apesar de achar que tem muita razão naquilo que disse) mas por achar que o ataque que lhe foi dirigido foi seco, brutal e sem o mínimo de respeito; respeito que era, curiosamente, o que os seus opositores lhe exigiam sobre a intocável - em Portugal se não é pelo menos parece - instituição que é a Igreja Católica. Este ataque foi de tal forma cego que muitas pessoas enxovalharam o novo romance do escritor sem sequer lhe pôr os olhos em cima, e muitas outras, incluindo, imagine-se, um eurodeputado!, exigiram (como se isso lhes competisse) que o escritor cumprisse a ameaça de renunciar à nacionalidade portuguesa. Depois do que o Estado Português lhe fez em 1991 admiro-o por ainda cá pôr os pés e dar alguma importância a um país e sociedade que o tratam desta forma.
Ao ler o rol de alarvidades que se escreve hoje em dia em resposta a Saramago, não consigo deixar de esboçar um sorriso ao lembrar-me de um certo inquisidor humorístico...
O artista é um bom artista; não havia nexexidade. Vamos lá a continuar, mas com juizínho...Eles andam aí, os Diáconos Remédios...